A marchinha de Carnaval faz parte da história da música brasileira e é mais velha do que o samba. Quando Donga registrou sua composição PELO TELEFONE, oficialmente considerado o primeiro samba da história, a marchinha Ô ABRE ALAS de 1899, de autoria da maestrina Chiquinha Gonzaga, já contava com 17 anos de idade.
O
ritmo reinou absoluto no Carnaval durante o período de 1920 a 1960. Apenas a
partir da década de 1960 foi destituído nos desfiles das escolas de samba pelo
samba-enredo. Perdeu também espaço, lamentavelmente, nos blocos de rua para o
axé e canções descartáveis que mal duram até a próxima estação.
Permanecem,
todavia, as marchinhas, com suas letras provocativas
e de fácil memorização, na lembrança de todos. Traduzem o espírito alegremente transgressor
do nosso povo. "A marchinha é um gênero marcado pela crônica de época e
pela malícia", diz o musicólogo Ricardo Cravo Albin.
Devido
a suas características desaforadas, têm elas sido alvo de intolerância
decorrente da onda do politicamente correto que tem assolado nossa cultura nos
últimos tempos.
O
pesquisador Rodrigo Faour desaprova: “Sou contra o patrulhamento excessivo em
cima das músicas de carnaval. Elas são um patrimônio brasileiro, não podemos
botar uma carga tão pesada em cima delas. Existem palavras que não são aceitas
hoje, mas, na época, eram faladas de maneira não pejorativas”.
Algumas
das mais recentes trazem uma conotação sexual e de fato estão eivadas de preconceito
como é o caso de CABELEIRA DO ZEZÉ, MARIA SAPATÃO e A PIPA DO VOVÔ, divulgadas pelos
capciosos apresentadores de auditório Chacrinha e Sílvio Santos.
Permanecesse
nesse nicho, a polêmica não teria maiores repercussões para a cultura nacional.
O problema é quando a perseguição atinge compositores tradicionais como Haroldo
Lobo, Braguinha, Ary Barroso e Noel Rosa cujas músicas passaram ter sua
execução vetada, numa cruzada moralizadora não vista nem nos tempos do AI-5.
No
caso do pretenso ‘racismo’, a atenção voltou-se às centenas de canções que
usaram a palavra ‘mulata’ (presumidamente derivada de mula). Apesar da suposta
origem depreciativa, a questão é se vale a pena crucificar o termo, já
incorporado ao vocabulário cotidiano uma vez que o uso corrente consagrou uma
nova conotação sem nenhuma vinculação com a espúria raiz etimológica.
A
esse respeito, assim se manifesta o cronista Ruy Castro: “Das dezenas de
marchas que falam da ‘mulata’, muitas foram compostas por Assis Valente, Wilson
Baptista, Haroldo Lobo, Zé e Zilda, Haroldo Barbosa, Monsueto etc. etc., e
lançadas por cantores como Orlando Silva, Silvio Caldas, Aracy de Almeida,
Carmen Costa, Cyro Monteiro, Moreira da Silva, Jorge Veiga, Ângela Maria etc.
etc. Todos mulatos. E não viam nenhum problema nisso.”
Nem
mesmo o ícone Caetano Veloso escapou de constar no Index Prohibitorum por
referir-se em sua música TROPICÁLIA aos “olhos verdes da mulata”.
Uma
das principais vítimas da cruzada anti-racista foi a consagrada O TEU CABELO
NÃO NEGA, a mais famosa composição de Lamartine Babo, eleita pela Revista Veja
a 3ª maior marchinha de todos os tempos.
Além
da amaldiçoada palavra ‘mulata’, os atentos patrulheiros revisionistas se
fixaram no verso “mas como a cor não pega” (em que ‘pega’ teria o sentido de
transmitir a ‘maldição’ da cor negra). O jornalista Tárik de Souza, um dos
maiores estudiosos da nossa música, rebate alegando que o ‘pega’ em questão mais
possivelmente significaria ‘importa’, o que confere ao verso, ao contrário do
que propalam seus críticos, uma acepção anti-racista.
O
fato é que o humor atrevido não escapava da obra de Lamartine. Que ia muito além. Estende-se a clássicos como
SERRA DA BOA ESPERANÇA, SONHEI QUE TU ESTAVAS TÃO LINDA e a celebrada NO RANCHO
FUNDO. O samba-canção, parceria com Ary Barroso, recebeu inúmeras gravações
(inclusive de sertanejos como Chitãozinho e Xororó, cuja versão acabou
tornando-se a mais conhecida do público).
São de
Babo também duas das mais populares marchinhas de festas juninas, CHEGOU A HORA
DA FOGUEIRA e ISSO É LÁ COM SANTO ANTÔNIO, imortalizadas pela dupla Carmen
Miranda & Mário Reis.
Além
disso, compôs hinos para os principais times de futebol carioca (inclusive o do
América de que era torcedor).
Mas Babo
tornou-se mesmo famoso pelas suas conhecidas marchinhas que fizeram a alegria
dos foliões. Uma primorosa seleção foi reunida nesse disco, lançado pela
Copacabana, sob o nome de RIDE PALHAÇO, canção que abre o disco, inspirada na
ópera Pagliacci de Leoncavallo. Nele, o maior palhaço de todos os tempos, o debochado
Waldemar Seyssel, vulgo Arrelia, com sua irreverência circense, revela-se um
intérprete bastante apropriado para a divertida obra de Lamartine reunindo doze
dos melhores temas, alguns cantados em dueto com o próprio compositor.
Sob a
escrachada interpretação do palhaço, desfilam O TEU CABELO... e outras pérolas
carnavalescas como MOLEQUE INDIGESTO, LINDA MORENA, HISTÓRIA DO BRASIL e A.E. I.O.U
(parceria com Noel Rosa), além dos referidos temas juninos. Todas com o ilustre
acompanhamento da histórica bandinha do mestre Altamiro Carrilho, já à época um
dos flautistas mais requisitados pelos cantores do rádio.
Esse
foi o único LP de Arrelia que no entanto gravou vários 78 rotações, o mais
famoso em 1951, com a canção MUITO BEM ao lado do seu inseparável companheiro
de picadeiro Pimentinha (seu sobrinho) que revelou o famoso bordão “Como vai?
Como vai? Vai, vai, vai. Muito bem! Muito bem! Bem! Bem!” que se tornou sua
marca registrada durante sua vida artística no saudoso Circo do Arrelia que por
mais de 15 anos alegrou a petizada nas telas da TV Record.
Esse disco
(obviamente não lançado em CD) pode ser com alguma sorte encontrado em sebos.
.
Faixas:
01 –
Ride Palhaço (Marcha) – Lamartine Babo
02 –
Moleque Indigesto (Marcha) – Lamartine Babo
03 –
Ahi, Hein !?…(Marcha) – Lamartine Babo e Paulo Valença
04 –
História… Do Brasil (Marcha) – Lamartine Babo
05 –
A…E…I…O…U… (Marcha) – Lamartine Babo e Noel Rosa
06 –
Linda Morena (Marcha) – Lamartine Babo
07 –
Só Dando Com Uma Pedra Nela… (Samba) – Lamartine Babo
08 –
Isto É Lá Com Santo Antônio (Marcha – Canção) – Lamartine Babo
09 –
Babo…Zeira… (Ranchera – Charge) – Lamartine Babo
10 –
Chegou A Hora Da Fogueira (Marcha) – Lamartine Babo
11 –
Boa Bola (Marcha) – Lamartine Babo e Paulo Valença
12 –
Teu Cabelo Não Nega!… (Marcha) – Lamartine Babo e Irmãos Val
Marchinhas maravilhosas! Eu não perdia nenhum "Circo do Arrelia"
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