CLUBE
DA ESQUINA é o título do disco duplo de 1972 capitaneado por Milton Nascimento
e Lô Borges, unanimemente considerado um dos mais importantes da MPB. Porém, refere-se
também ao movimento composto por artistas que gravitaram em torno do memorável
álbum, mas que a ele transcendeu, caracterizando um estilo musical que agregou
influências múltiplas que iam da bossa nova aos Beatles, condimentado com um
temperinho de Minas Gerais, onde o rebuliço teve seu epicentro.
A
Odeon, à época sediada no RJ, centralizou as produções fonográficas da trupe.
Grande parte dos expoentes integrava o plantel da gravadora. Foi ela que resolveu
investir na carreira de quatro músicos que participaram diretamente do
movimento ou com ele tiveram algum vínculo.
Como eram
pouco conhecidos, a gravadora não se dispôs a lançar um disco para cada um, restringindo
a iniciativa, a um projeto “coletivo”. Os novatos eram apenas Beto Guedes,
Danilo Caymmi, Novelli e Toninho Horta, artistas que hoje dispensam
apresentações.
O
álbum ganhou imensa importância histórica por ter representado a estreia fonográfica
desses quatro grandes músicos. Beto Guedes e Toninho Horta, sobretudo, viriam a
construir exitosas carreiras individuais, a partir de seus bem sucedidos trabalhos
de estreia, respectivamente A PÁGINA DO RELÂMPAGO ELÉTRICO (1977) e TERRA DOS
PÁSSAROS (1980). Toninho viria a alcançar notoriedade também no exterior, onde chegou
a ser referenciado como um dos melhores guitarristas do mundo, segundo a
prestigiosa revista Melody Maker.
A
reunião não foi aleatória. Esses quatro músicos já tinham o histórico de convergir
suas carreiras em trabalhos de outros artistas. Os quatro, por exemplo, haviam
participado do primeiro álbum solo de Lô Borges (o chamado “disco do tênis”), bem
como do aclamado NÉLSON ÂNGELO & JOYCE, ambos datados de 1972 e pelo selo
Odeon.
A
capa traz unicamente os nomes dos titulares pichados numa parede ocre. Porém, a
foto da contracapa, tirada durante a sessão de gravação, em que os quatro
vistos de cima rodeiam a privada sem tampa do tosco e minúsculo banheiro do
estúdio, tornou-se mais célebre que a própria capa. Segundo revelou Toninho, essa
imagem escatológica traduz bem as precárias condições de gravação
disponibilizadas pela gravadora. Ao que consta, os músicos vararam a madrugada
para concluir o trabalho numa única tacada.
A
própria Odeon parece não ter botado muita fé na proposta, não condizente com os
padrões de mercado, sequer tendo se empenhado em fazer divulgação do LP e retirando-o,
em pouco tempo, de catálogo, o que o tornou uma raridade, alcançando preços
astronômicos no mercado de usados.
Não
obstante a questionável idealização de se fatiar o disco em quatro (cabendo duas
faixas a cada um, exceto Novelli que ganhou três, duas delas instrumentais), a
audição revela uma grande integração entre os músicos que, aliás, participam
uns das faixas dos outros.
Tal
afinidade é mais surpreendente se constatarmos que os estilos guardam
características distintas com Beto tendo no rock progressivo sua área de maior
interesse, Toninho no jazz, Danilo na bossa nova e o pernambucano Novelli tendo bebido na fonte dos ritmos nordestinos.
Essas particularidades se diluem ao longo da obra.
Não
se pode deixar de destacar o time respeitável de apoio que inclui Lô Borges,
Flávio Venturini, Nélson Ângelo, Robertinho Silva, Paulo Jobim, Tenório Jr,
Fernando Leporace, Maurício Maestro e Fredera.
O
disco traz a gravação original de um dos mais famosos temas de Toninho Horta,
“Manuel, o Audaz” (nome dado a um jeep no qual a patota rodava solta pelas
estradas de Minas), parceria com Fernando Brant, canção que viria a receber a
consagração definitiva em seu disco de 1980, brindada com um belo solo de
guitarra de Pat Metheny.
Traz
ainda a surpreendente “Belo Horror” com Beto Guedes, extensa faixa predominantemente
instrumental com complexas digressões, remetendo em sua concepção aos clássicos
do rock progressivo de grupos como o Yes e o Genesis, que, à época, viviam sua
fase áurea. A canção traz a assinatura
de Beto, Márcio Borges mais dois ilustres desconhecidos, Flávio Hugo e José
Geraldo que viriam a ser ninguém menos do que Flávio Venturini e Vermelho, futuros
integrantes do 14 Bis.
Em
“Ponta Negra”, como contraponto à interpretação de Danilo Caymmi, pode ser
identificada ao fundo a segunda voz de Nana que deu uma canja para o irmãozinho.
A
despeito de sua importância para a MPB e das referências elogiosas, esse disco
pouco conhecido e subestimado não mereceu sequer uma versão digital, tendo sido
lançado em CD (que novidade!) apenas no Japão.
.
Faixas:
01. Beto Guedes -
Caso Você Queira Saber (Beto Guedes, Márcio Borges)
02. Toninho Horta
- Meu Canário Vizinho Azul (Toninho Horta)
03. Novelli - Viva
Eu (Wagner Tiso, Novelli)
04. Beto Guedes -
Belo Horror (Beto Guedes, Flavio Hugo, José Geraldo , Márcio Borges)
05. Danilo Caymmi
- Ponta Negra (Danilo Caymmi, João Carlos Pádua)
06. Novelli -
Meio A Meio (Novelli)
07. Toninho Horta
- Manuel, O Audaz (Toninho Horta, Fernando Brant)
08. Novelli -
Luiza (Novelli)
09. Danilo Caymmi
- Serra Do Mar (Danilo Caymmi, Ronaldo Bastos)
Nenhum comentário:
Postar um comentário