O
quarto álbum da carreira de Erasmo ficou meio esquecido em meio à discografia
do roqueiro, talvez por guardar a triste sina de ter sido concebido no período
em que o Tremendão estava de relações cortadas com seu eterno parceiro Roberto
Carlos. Por conseguinte, não traz nenhuma faixa de autoria da dupla Roberto
& Erasmo, a mais profícua parceria da história da música brasileira (por
alguns considerada a equivalente tupiniquim da dobradinha Lennon & McCartney),
responsável por um número infindável de canções do repertório de ambos que
fizeram história. O rompimento das relações com o Brasa durou mais ou menos um
ano e é detalhado no filme biográfico MINHA FAMA DE MAU de 2019.
Pra
piorar, Erasmo vinha de uma situação de desgaste por ter sido indiciado juntamente
com Eduardo Araújo por prática de sexo com duas adolescentes numa ‘festa de
arromba’, acusação da qual, embora absolvido, reforçou negativamente sua ‘fama
de mau’.
Erasmo
vinha de uma fase afortunada, tendo emplacado hits como FESTA DE ARROMBA,
GATINHA MANHOSA, A CARTA, O TREMENDÃO e PODE VIR QUENTE QUE EU ESTOU FERVENDO,
presentes nos 3 primeiros discos. Mas agora a Jovem Guarda mostrava sinais de
esgotamento e o programa da TV Record que reunia a patota ligada ao gênero vivia
seu ocaso, frente às novas tendências da música brasileira (tropicalismo,
músicas de protesto, festivais etc.).
O
álbum sem título de 1967 parecia ser o derradeiro suspiro no movimento. A
própria capa transparecia essa mudança com Erasmo posando com ar solene, cabelo
alinhado e trajes distintos com uma garbosa gola rolê, que em nada lembrava a
postura irreverente dos tempos áureos do iê-iê-iê.
Mas a
Jovem Guarda ainda se fez presente no álbum, com seus temas românticos banais em
duas composições de Erasmo. Há participação de músicas de Carlos Imperial e Martinha.
Mas
já há sinais de flertes com o samba-rock e a MPB como no improvável clássico
NÃO ME DIGA ADEUS (Paquito, Luís Soberano e João Correia da Silva), do
repertório de Aracy de Almeida, Hebe Camargo, Elza Soares e Nara Leão.
Nos
discos seguintes, Erasmo aprofundaria essa busca de novos rumos, especialmente
no álbum de 1970 (com canções emblemáticas como COQUEIRO VERDE e SENTADO À
BEIRA DO CAMINHO além da presença de composições de Caetano, Ary Barroso e
Antônio Adolfo).
Outro
destaque do disco de 1967 é CARAMELO, versão do mega-hit MELLOW YELLOW. Os
versos transladados para português por Roberto Carlos, sua solitária
contribuição ao álbum, fazem referência ao sabor de um beijo, bem diferente do
original do cantor folk escocês Donovan que, especula-se, seria sobre uma droga
alucinógena derivada de uma casca de banana.
Mas a
cereja do bolo é, sem dúvida, CADERNINHO que, embora frequentemente atribuída a
Erasmo, é na verdade uma composição de Alemão, codinome do guitarrista Olmir
Stocker, que posteriormente iria se consagrar como um dos mais conceituados
nomes da música instrumental nacional, tendo integrado grupos de primeira como
Brazilian Octopus (ao lado de Lanny Gordin e Hermeto) e Medusa (em substituição
a Heraldo do Monte). Ao que consta, Alemão aderiu à Jovem Guarda por razões
comerciais. O músico teve participação expressiva no álbum assinando quatro
faixas. CADERNINHO certamente foi a canção que mais lhe rendeu direitos
autorais. O compacto com a canção fez estrondoso sucesso, figurando entre os
mais vendidos do ano. O êxito deveu-se ao delicioso arranjo inspirado na
estética dançante, embalado por palmas, característica de Chris Montez, que estourara
mundialmente com “The More I See You” alguns meses antes.
Wilson
Simonal que anteviu semelhanças com o ‘som de pilantragem’, de que era seu
representante máximo, manifestou interesse em interpretar a canção em primeira
mão. A preferência por Erasmo deveu-se à interferência de Wanderléa junto a
Alemão, de quem era muito próxima, tendo-o inclusive convidado a integrar sua
banda de apoio, Os Wandecos.
Além
de Alemão, o álbum contou com a preciosa colaboração do trombonista Raul de
Souza e do Som Três de César Camargo Mariano. Contou ainda com o suporte dos
grupos jovem-guardistas Fevers e Wandecos.
Esse
subestimado álbum pertence ao catálogo da RGE, que bancou o ingresso de Erasmo
no estrelato, porém a gravadora jamais o lançou em CD. Tendo assumido o
catálogo da RGE, a BMG, recuperou-o como parte do box TREMENDÃO que contém os
seis primeiros álbuns de Erasmo, remasterizados e com fichas técnicas. Ganhou
ainda duas faixas bônus: uma versão estendida de CADERNINHO mais a canção
CAPOEIRADA de sua autoria, uma rara participação de Erasmo em festivais (III
Festival de MPB da TV Record), desclassificada na fase eliminatória do evento,
vencido por Edu Lobo com “Ponteio”.
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Faixas:
1. Cara Feia Pra Mim
É Fome (Olmir Stocker ''Alemão''/Vicente de Paula Salvia)
2. O Ajudante do
Kaiser (I Was Kaiser Bill's Batman) (Roger Cook/Roger Greenaway/Vrs. Fred
Jorge)
3. Neném, Corta Essa
(Erasmo Carlos)
4. Só Sonho Quando
Penso Que Você Sente o Que Eu Sinto (Martinha)
5. O Caderninho
(Olmir Stocker ''Alemão'')
6. Larguem Meu Pé
(Erasmo Carlos)
7. Caramelo (Mellow
Yellow) (Donovan Leitch/Vrs. Roberto Carlos)
8. Saidinha e
Assanhada (Vicente de Paula Salvia)
9. Quase Perdi Seu
Amor (Olmir Stocker ''Alemão''/Newton de Siqueira Campos)
10. Brotinho Sem
Juízo (Carlos Imperial)
11. A Garotinha da
Estação (Newton de Siqueira Campos/Olmir Stocker ''Alemão'')
12. Não Me Diga Adeus
(Paquito/Luis Soberano/João Correia da Silva)