“Doces
Bárbaros” foi a designação conferida a um supergrupo efêmero (de um só disco)
formado por Caetano, Gil, Gal e Bethânia.
Apesar
de reunir a elite baiana da MPB, no auge de suas respectivas carreiras, esse álbum
duplo ao vivo permanece até hoje no limbo. Em pouco tempo, foi retirado de
catálogo pela Philips que fortuitamente contava com os quatro em seu plantel. Apesar
do prestígio dos integrantes, o disco não emplacou nem mesmo entre os inúmeros
fãs que continuaram prestigiando os trabalhos solo de carreira.
De
fato, o álbum parecia mesmo não ter sido destinado a alcançar sucesso comercial.
As interpretações fogem do convencional. Algumas faixas se estendem por 7 ou 8
minutos. As vozes dos intérpretes não vibram em uníssono, uma se sobressai à
outra, aparentando falta de entrosamento.
Ainda
que contando com uma banda de suporte de primeira (Tomaz Improta ao piano,
Arnaldo Brandão no baixo, Perinho Santana na guitarra, Chiquinho Azevedo na
batera, Tuzé de Abreu e Mauro Senise nos sopros e Djalma Corrêa na percussão) e
sem contar com os recursos de estúdio, a qualidade técnica das gravações deixa
a desejar.
Além
de problemas com a censura (que cortou uma das faixas), houve um contratempo
inesperado com as autoridades: Gil foi detido por porte de maconha,
interrompendo a peregrinação do espetáculo ainda em seu início.
Pra
culminar, o álbum teve receptividade negativa dos críticos. Com tantas agruras,
o disco parecia estar fadado ao fracasso.
No
entanto, uma leitura atual inclina-se a resgatar os créditos desse injustiçado álbum.
Muito do que foi objeto de crítica, mereceria ser motivo de louvor. A ausência
de recursos técnicos foi amplamente compensada pela emoção e improviso do show
ao vivo (apenas 4 faixas foram gravadas em estúdio). Ao abrir mão do formalismo
e privilegiar a autenticidade, o registro capta mais fielmente o espírito
libertário que permeava a ligação entre os quatro artistas que mantinham uma
relação de proximidade que até hoje perdura. Provindos (à exceção de Bethânia)
do tropicalismo e submetidos, no caso de Gil e Caetano, ao exílio, vivenciavam
à época uma fase hippie/esotérica, atestável pelo visual descolado, o porte
magérrimo, trajes brancos folgados, pulseiras, colares. Sem abrir mão da
ousadia e do experimentalismo como nas desbundantes “Peixe”, “Tarasca Guidon” e
“Eu e Ela Estávamos Ali Encostados na Parede”, prevaleceu a intenção de
resgatar as raízes afro-baianas.
A
ascendência de Bethânia (a quem, aliás, deve-se a iniciativa de promoção do
histórico encontro) deve ter interferido no rumo do projeto. Na verdade, a
proposta do encontro dos quatro mitos era basicamente comemorar seus dez anos
de carreira. Aparentemente, tratava-se de uma ‘média aproximada’, já que as
carreiras fonográficas de Bethânia e Gil tinham respectivamente onze e treze
anos enquanto as de Caetano e Gal contava nove anos (desde o álbum comum
DOMINGO).
Apesar
da celebração, grande parte das 18 faixas era de inéditas, a maioria
composições de Gil e Caetano. As exceções ficam por conta de “Fé Cega Faca
Amolada” do repertório de Milton Nascimento, “Tarasca Guidon” de Waly Salomão e
do clássico “Atiraste uma Pedra” de Herivelto Martins e David Nasser.
Afora todas
considerações, um disco que traz a marca desses quatro geniais artistas em
perfeita sintonia e no auge da criatividade, só pode figurar em primeiro plano.
.
Faixas:
-
Disco 1
1. "Os Mais
Doces Bárbaros" (Caetano Veloso) - 6:42
2. "Fé Cega,
Faca Amolada" (Milton Nascimento, Ronaldo Bastos) - 5:30
3. "Atiraste
Uma Pedra" (Herivelto Martins, David Nasser) - 3:59
4. "Pássaro
Proibido" (Maria Bethânia, Caetano Veloso) - 4:38
5. "Chuck Berry Fields Forever" (Gilberto Gil)
- 5:25
6. "Genesis"
(Caetano Veloso) - 8:46
7. "Tarasca
Guidon" (Waly Salomão) - 7:27
-
Disco 2
1. "Eu e Ela
Estávamos Ali Encostados na Parede" (Gilberto Gil) - 4:13
2. "Esotérico"
(Gilberto Gil) - 4:09
3. "Eu Te
Amo" (Caetano Veloso) - 3:00
4. "O Seu
Amor" (Gilberto Gil) - 4:27
5. "Quando"
(Gal Costa, Caetano Veloso, Gilberto Gil) - 4:13
6. "Pé
Quente, Cabeça Fria" (Gilberto Gil) - 3:49
7. "Peixe"
(Caetano Veloso) - 3:16
8. "Um
Índio" (Caetano Veloso) - 4:42
9. "São João,
Xangô Menino" (Caetano Veloso, Gilberto Gil) - 4:31
10. "Nós, Por
Exemplo" (Gilberto Gil) - 4:01
11. "Os Mais
Doces Bárbaros" - Reprise (Caetano Veloso) - 1:20
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